Editorial do nº37-38 d’O Trabalho

A verdadeira natureza da “União Europeia”, temo-lo dito aqui, tem que ver com tudo menos a construção de uma união livre e pacífica de nações europeias.

“União Europeia” é a pomposa etiqueta que deram a uma teia de tratados e instituições criada para subordinar as nações ao império dos mercados de capitais e financeiros ⎼ e para, de passagem, afastar todos os “obstáculos” democráticos inscritos pela luta dos povos europeus nas legislações e ordens internas de cada país: em primeiro lugar, o princípio de a soberania (“una e indivisível”, diz o artigo 3º da Constituição portuguesa) residir no povo.

Não admira, assim, que as eleições para este mal chamado Parlamento Europeu tivessem resultados nacionalmente muito variados, reflectindo a situação da luta de classes em cada país. Do mesmo passo, porém, tiveram um forte tema comum.

Esse tema comum foi, claramente, a guerra.

Há evidências a que não é possível fugir:

O presidente Macron de França, ponta de lança da generalização da guerra, do envio de finança e canhões – e agora, também, de tropas “europeias” – para o teatro de guerra na Ucrânia, teve 7% dos votos do eleitorado francês. Perdeu ⅔ dos votos que o reelegeram há dois anos. Teve que dissolver o parlamento e convocar novas eleições legislativas.

Os partidos da coligação chefiada pelo chanceler Scholz da Alemanha, principal suporte financeiro da guerra da NATO na Ucrânia, tiveram, no caso do SPD – que foi o grande partido da classe operária alemã -, o pior resultado da história, pouco mais de 8% do eleitorado; e, no caso do partido dos Verdes, que outrora se autodenominava partido da “paz, da desnuclearização e da ecologia” e agora se converteu, a uma velocidade alucinante, em partido da guerra, da renuclearização e da destruição do planeta, um resultado ainda pior.

É certo que, nos vários países da Europa, o “partido da guerra” abrange hoje em dia a quase totalidade do espectro político, da extrema-direita fascizante aos partidos da chamada extrema-esquerda: os Blocos de Esquerda, France insoumise e outros Podemos.

Todos eles votaram por mandar centenas de milhar de milhões de euros em armas ao oligarca-chefe ucraniano Vladimiro – o Vladimiro com mais ganas de acorrentar o seu país à NATO e UE -, para ele derrotar o oligarca-chefe russo Vladimiro, ele também, inicialmente, disposto a acorrentar-se à NATO e à UE, até lhe ser explicado que não, que, no seu caso, o Estado russo tinha de ser estilhaçado, como já fora a Iugoslávia, assim o queria Washington, e que, se ele não estivesse disposto a fazer o competente harakiri, pois iria ter de lançar centenas de milhar de jovens russos para a fornalha da guerra, que o “nosso” Vladimiro de Kiev tinha jovens ucranianos em barda para queimar também…

Na página 2, indicamos os resultados das eleições para o “Parlamento Europeu” em Portugal. Indicamo-los da maneira mais simples, a única correcta e democrática: cada eleitor tem um voto e direitos iguais; os votos de cada partido são, pois, parcelas da votação (ou abstenção) dos eleitores no seu todo. Assim, o PS, o “vencedor”, teve 13,6% dos eleitores; o Chega, 4%…

Assim, em França, a “grande subida” da extrema-direita de Le Pen foi conseguir um número de eleitores… inferior ao que a senhora teve nas presidenciais de 2022.

Não coincide com a conversa preocupada ou eufórica do comentário televisivo e jornalístico?

Cabe ao leitor ver onde está o problema…

Em Portugal, depois da “vitória da direita”, as acções, mobilizações e greves dos trabalhadores não diminuíram, pelo contrário. Muitos podem ter deixado de votar, por não acreditarem que isso mude alguma coisa. Mas cresce o número de trabalhadores e jovens que, instintivamente, sabe que só pode acreditar na sua própria força organizada.

Sabe que é preciso lutar pela ruptura com a política de guerra no exterior e no interior.

Sabe que é preciso organizar-se para lutar pelas reivindicações, pelos direitos, por Abril, acabar com os que promovem a divisão e a segmentação das lutas.

Sabe que é preciso romper com os critérios, as políticas e as imposições da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e dos senhores da guerra em todo o mundo.

Sabe, como os jovens russo e ucraniano que tomaram juntos a palavra no comício internacionalista de Paris de 2 de Junho (página 10):

Contra a guerra e a barbárie imperialista, trabalhadores de todos os países, uni-vos!