Por trás da guerra… a guerra do gás

Artigo de Jean Alain, La Tribune des travailleurs (França), de 12 de Outubro

Oito dias antes da invasão de Ucrânia, em 16 de Fevereiro de 2022, La Tribune des travailleurs publicou uma contribuição do activista anti-guerra americano Jack Rasmus, intitulada: “Dez razões por que os EUA queriam que a Rússia invadisse a Ucrânia.” Entre estas razões, Rasmus mencionava a guerra do gás: “O gás russo é muito mais barato do que o gás natural comprado aos EUA. Durante anos, os EUA têm vindo a pressionar a Alemanha para parar o projecto Nordstream 2 e comprar gás natural liquefeito aos EUA a preços mais elevados. (…) As companhias petrolíferas americanas querem vender o gás que têm, a fim de eliminar o excesso de oferta nos EUA. Isto não só para terem lucro, vendendo mais à Alemanha, mas também para criar escassez de oferta nos EUA, o que permitiria às empresas americanas aumentar os seus preços no mercado interno dos EUA.”
Sete meses depois, qual é a situação? As sanções contra a Rússia e os actos de sabotagem contra os gasodutos Nordstream 1 e 2 secaram significativamente os fluxos de gás russo para a Europa. A Agência Internacional de Energia (IEA) dá disso nota: “O corte do gás russo em resposta às sanções contra Moscovo desde que começou a invasão da Ucrânia fez subir os preços nos mercados mundiais e levou os europeus a procurarem abastecimento noutras fontes, através da importação de quantidades maciças de gás natural liquefeito (GNL), nomeadamente o americano” (Agence France-Presse, 3 de Outubro).
O problema: “Estão os EUA a cobrar preços indecentes no mercado do gás? Sim, acha Berlim. O ministro alemão da economia lamentou na quarta-feira os preços “astronómicos” exigidos pelos países “amigos” da Alemanha, com os Estados Unidos à cabeça, para fornecerem o gás necessário para compensar o fim das entregas russas (…). O país, tal como o resto do continente como um todo, voltou-se mormente para os Estados Unidos, cuja quota-parte das importações europeias de GNL aumentou de 28% para 45% entre 2021 e 2022” (Agence France-Presse, 5 de Outubro).
Mas como o infortúnio de uns – os capitalistas europeus, especialmente os alemães, que não deixarão de passar a factura aos trabalhadores para eles a pagarem – faz a fortuna de outros, os capitalistas dos Estados Unidos estão assim a abrir para si um mercado imenso. Mercado ontem ainda inesperado, visto que o GNL deriva do gás de xisto, que é extrema- mente poluente: “O gás natural liquefeito tem, efectivamente, uma pegada de carbono muito pior do que do que a do gás fornecido por gasoduto. Emite em média 2,5 vezes mais CO2, segundo um estudo levado a cabo pela consultoria Carbone 4. As razões prendem-se quer com o transporte, quer com a distância dos depósitos quer com o modo de extracção” (La Croix, 16 de Abril de 2022).
Os mesmas que nos passam a vida a dar lições sobre o ambiente esquecem-se de repente dos belos discursos quando está em jogo o lucro! Para os capitalistas dos Estados Unidos, “aliciados pelo forte aumento da procura europeia e apesar das incertezas a longo prazo, os produtores americanos estão a investir a todo o gás em novas infra-estruturas. Três grandes projectos em construção na costa do Golfo do México deverão aumentar em mais de 50% as capacidades americanas até 2027″ (Les Échos, 4 de Outubro). Que importa a poluição, a guerra e a “sobriedade energética” (para os trabalhadores), contanto que os lucros de Wall Street fiquem garantidos!