Netanyahu prepara-se para ordenar o assalto a Rafah. Rafah é a cidade mais a Sul da Faixa de Gaza, na fronteira com o Egipto, que – com o acordo de Israel – aí controla um ponto de passagem. Antes de 7 de Outubro, a população de Rafah era de 160.000 habitantes. Após quatro meses de bombardeamentos e de destruição das cidades de Gaza, Khan Younis e dos campos de refugiados adjacentes, refugiaram-se lá quase um milhão e meio de palestinianos.
Em Rafah, dezenas de milhares de palestinianos amontoam-se em tendas improvisadas, com os pés na lama devido à chuva. Não há comida suficiente: um ovo custa agora um dólar americano! As epidemias fazem vítimas. Cada homem, mulher e criança tem direito, em média, a 1,5 litros de água por dia para beber, cozinhar e lavar-se.
Mas, levando ao limite a lógica do sionismo, Netanyahu e o seu governo decidiram: como as outras cidades de Gaza e Khan Younis, Rafah deve ser apagada do mapa. Os que sobreviverem à carnificina, espera o primeiro-ministro israelita, partirão para o Egipto e para o deserto do Sinai. O bombardeamento de Rafah já começou. Segundo o New York Times, “os ataques israelitas aterrorizam os refugiados em Rafah, muitos dos quais vivem em tendas improvisadas e não têm para onde ir“. Depois dos bombardeamentos, Netanyahu lançou, a 9 de Fevereiro, uma ofensiva terrestre contra Rafah, que pretende concluir até 10 de Março.
Do lado egípcio, o regime militar do marechal Sissi ameaçou “suspender” o acordo de paz com Israel (assinado em 1979, sob a égide dos Estados Unidos) se palestinianos atravessarem a fronteira, escreve o Wall Street Journal (9 de Fevereiro). Não é claramente a solidariedade com o povo palestiniano que move o regime de Sissi, cúmplice do bloqueio de Gaza e cujos navios de carga fazem entregas diárias nos portos israelitas. Em contrapartida, o regime egípcio está consciente de que não conseguiria gerir o acolhimento de centenas de milhares de palestinianos no seu território numa altura em que o país está já à beira de uma explosão social.
A Reuters relata que dezenas de tanques e veículos blindados egípcios foram estacionados do outro lado do posto fronteiriço de Rafah, tendo um muro de betão (que mergulha seis metros pelo solo abaixo) e barricadas de areia sido levantados para impedir a passagem.
Por seu lado, Biden, numa longa conversa telefónica com Netanyahu, a 12 de Fevereiro, terá pedido a este último que não entrasse em Rafah sem um “plano credível para os civis” que lá se encontram. Estas declarações destinavam-se, nomeadamente, a tranquilizar o seu vassalo egípcio. Pois quem há-de acreditar que Biden se preocupa com os civis de Gaza, quando todos os dias manda fornecer a Israel milhares de bombas “made in USA” sem as quais o genocídio não poderia acontecer?
Perante a barbárie e o derramamento de sangue que se preparam e perante a criminosa cumplicidade de todas as grandes potências, saúde-se o apelo lançado pelo jornalista israelita Gideon Levy no diário Haaretz, de 11 de Fevereiro:
“Tudo o que podemos fazer agora é pedir, suplicar e gritar: não entrem em Rafah! Uma incursão israelita em Rafah seria um ataque ao maior campo de deslocados do mundo.
Envolveria o exército israelita em crimes de guerra de uma gravidade que nem ele ainda cometeu. É impossível invadir hoje Rafah sem cometer crimes de guerra. Se as FDI invadirem Rafah, a cidade tornar-se-á uma vala comum.“
Governos ocidentais “cúmplices da carnificina”
Rony Brauman, antigo presidente dos Médicos Sem Fronteiras, denunciou à France Info, em 8 de Fevereiro, que as atrocidades cometidas pelo exército israelita em Gaza “estão a ser cometidas com a cumplicidade de países que reivindicam o direito internacional, o direito humanitário e a legalidade internacional, ou seja, os países ocidentais, em primeiro lugar os Estados Unidos. Mas com o concurso activo de países europeus como a Alemanha, a Grã-Bretanha e a França“, que ele considera serem “activamente cúmplices desta carnificina“. Questionado sobre as pressões dos Estados Unidos e da União Europeia para uma “trégua”, referiu que tal seria “inteiramente desejável, mas, entretanto, os fornecimentos de armas e munições continuam a ritmo constante. Todos os dias, há uma espécie de ponte aérea entre os Estados Unidos, em particular, mas também a Europa, e Israel, que permite disparar milhares e milhares e milhares de mísseis e munições diversas.
Há algo de contraditório em, de um lado, apelar a uma trégua e, do outro, continuar com os abastecimentos de armas e munições“. É um facto: o exército israelita não dispõe de reservas de munições suficientes para continuar o genocídio. Sem as armas e o apoio dos Estados Unidos e dos governos europeus, Netanyahu não poderia continuar o massacre por mais de vinte e quatro horas.
Quanto às Nações Unidas, observa Rony Brauman que “os apelos da ONU não só não servem para nada, como Benjamin Netanyahu lhes faz um manguito. (…) Sobreviverão as Nações Unidas a esta provação, sabendo que um órgão das Nações Unidas (1) fala de plausibilidade de estar a ser perpetrado um genocídio na Faixa de Gaza e que os membros do grupo de membros permanentes do Conselho de Segurança (2) continuam a abastecer o lado que tem a culpa exclusiva do genocídio? “