Intervenção Portuguesa na Conferência Mundial em Mumbai, Índia

INTERVENÇÃO DO DELEGADO PORTUGUÊS NA CONFERÊNCIA MUNDIAL DE MUMBAI, 

19 de Novembro de 2016

Sou Jorge Torres, tenho 61 anos e trabalho no sector de cartonagem e papel, na filial portuguesa de uma empresa multinacional espanhola (SAICA), com cerca de 9.000 trabalhadores. Sou, há cerca de 20 anos, membro da Comissão de Trabalhadores da empresa.
As comissões de trabalhadores nasceram, em Portugal, na grande revolução de 1974-75. Foram criadas para representar os trabalhadores de cada empresa e construir uma representação colectiva dos trabalhadores em todo o país. Foram um movimento tão forte, que, ainda hoje, 40 anos depois, subsistem como componente indispensável do movimento operário português, ao lado dos sindicatos.
Sou também, aliás, delegado sindical de um sindicato filiado na CGTP, a maior central sindical em Portugal.
Foi com agrado que aceitei estar presente nesta conferência mundial em Mumbai. Fi-lo porque sou um acérrimo defensor dos direitos humanos em todas as suas vertentes, quer no trabalho quer na igualdade de oportunidades. Sou contra qualquer tipo de guerra provocada por gananciosos e parasitas da sociedade, que vivem apenas para subjugar povos e nações. Sou contra chacinas para exterminar raças. E sou contra a exploração do homem pelo homem.
Vivemos numa sociedade falida, sem princípios, onde os principais negócios são: as armas, os medicamentos e a religião.
A situação laboral em Portugal é de contenção salarial e precariedade do trabalho. O patronato exige dos trabalhadores aquilo a que chama “polivalência total”: ou seja, a destruição das qualificações.
Tivemos em Portugal, durante muitos anos, um governo de direita que aplicou a política da troika da União Europeia e do FMI. Esta política pôs de rastos os trabalhadores. A contratação colectiva tornou-se praticamente inexistente. Os contratos de trabalho passaram a só ser negociados se o patronato concordasse. Assim, os contratos foram caducando, sem serem substituídos por novos contratos. O Governo legislava neste sentido. Diminuiu os salários na função pública. Cortou as pensões de reforma, que os trabalhadores haviam adquirido ao longo de décadas de trabalho, como salário diferido. Quebrou, assim, uma das promessas mais sagradas do que eles próprios chamam o “contrato social”. Este governo da direita, enfeudado à União Europeia, aumentou também o horário de trabalho dos funcionários públicos; suspendeu verbas do Serviço Nacional de Saúde; fechou escolas; despediu professores; e aumentou enormemente os impostos. Em poucos anos, o nosso país recuou mais do que tinha progredido nos trinta anos anteriores.
Esta foi a política desastrosa do governo às ordens da troika da União Europeia. O pretexto era diminuir o dito défice do Estado e cumprir o que eles chamam os “compromissos internacionais” do país, pagar a utilização dos empréstimos contraídos junto da grande banca mundial. O desemprego, entretanto, subia brutalmente.
O novo governo do PS, que tem o apoio parlamentar do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda e está em funções desde as eleições de final de 2015, repôs (mas não inteiramente) o horário de trabalho das 35 horas semanais. Repôs (mas só em parte) os salários dos funcionários públicos. Repôs (mas só em parte e sem efeitos retroactivos) as pensões roubadas aos trabalhadores aposentados. Aumentou o salário mínimo… em 15 euros.
Contudo, a legislação laboral, que o governo de direita fortemente lesara, continua por rever, sobretudo no que diz respeito à restauração da negociação colectiva.
Será importante aqui referir que as organizações patronais declararam aceitar um aumento (muito ligeiro) do salário mínimo, mas só na condição de não se tocar na legislação laboral desfigurada pelo governo anterior. Por outras palavras: o importante para o patronato é manter a precariedade laboral, a exploração e a chamada “caducidade” da contratação colectiva.
Neste momento, o sector da saúde em Portugal encontra-se em grandes dificuldades por falta de verbas e em processo de acelerado desinvestimento. Ao mesmo tempo, Bruxelas/UE exige cortar mais mil milhões de euros nas despesas públicas.
Que resposta irá dar o governo a estas novas imposições de cortes de Bruxelas? Tanto quanto sabemos, o governo diz que, antes de mais nada, cumprirá as directivas da Comissão Europeia. Assim sendo, certamente a luta dos trabalhadores contra estas políticas desastrosas irá continuar e acentuar-se.
Concordo, assim, com esta Conferência Mundial de Mumbai, porque a situação da classe trabalhadora é degradante em todo o mundo, seja na Índia, em Portugal ou em tantos outros países.
Esta conferência é, assim, uma maneira forte de demonstrar que os trabalhadores não aceitam a guerra; não aceitam a exploração; não aceitam a precariedade laboral a que estão sujeitos por causa da chamada globalização. Esta conferência serve para trocarmos experiências, para podermos dar passos concretos na caminhada para um futuro mais promissor.
Precisamos da unidade de todos os trabalhadores, com os seus sindicatos, para sermos mais fortes face ao patronato e ao capitalismo falido, para conseguirmos melhores salários, melhores contratos e condições de trabalho. Para isso, é necessária uma organização mundial de solidariedade e de defesa dos direitos dos trabalhadores e dos povos em geral. A riqueza, somos nós que a criamos; riqueza que é, porém, apropriada por uma minoria de exploradores.
Fica assim aqui o meu apelo para que as organizações representativas dos trabalhadores, eleitas por nós, trabalhadores, defendam os reais direitos e interesses consagrados nas contratações colectivas e não estejam subjugadas a partidos políticos, porque essas leis partidárias apenas defendem interesses privados.
VIVA A UNIÃO DOS TRABALHADORES!
VIVA A CONFERÊNCIA DE MUMBAI!