Saúde: «Não é possível governar o sector sem um forte investimento financeiro e sem uma gestão adequada»

Citação de Alexandre Lourenço,
presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares

Estando em curso a luta dos enfermeiros especialistas em saúde materna e obstétrica pela dignificação da sua carreira, gerando a paralisia de vários blocos de partos que ameaça alastrar-se a outros hospitais, em simultâneo com a prossecução da greve de quase uma semana dos técnicos de diagnóstico e terapêutica, a jornalista Natália Faria perguntou ao presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), Alexandre Lourenço: «Ao protesto dos enfermeiros soma-se a ameaça de greve dos médicos, a greve dos técnicos de diagnóstico e terapêutica e, mais à frente, dos farmacêuticos do SNS. Os hospitais estão preparados para isto?» tendo obtido a seguinte resposta:

«Antes de mais, quero frisar que são reivindicações legítimas, num sector de elevada complexidade que tem sofrido restrições financeiras elevadas. As condições de trabalho dos profissionais de saúde degradaram-se muito devido ao corte de investimento que se verifica desde 2009. Apesar do esforço dos últimos anos na contratação e na reposição salarial, as condições de trabalho continuam aquém do desejável, num sector em que existe uma procura crescente, nomeadamente por causa do envelhecimento da população». Ao concluir a entrevista, a jornalista perguntou ainda: «Acabou-se o estado de graça do ministro da Saúde?», ao que o presidente da APAH respondeu. «Não creio que as coisas se possam pôr nesses moldes. O que temos vindo a alertar é que não é possível governar o sector sem um forte investimento financeiro e sem uma gestão adequada. Continuamos a ter uma burocratização extrema no sistema. Imagine um enfermeiro que esteja de licença de maternidade e que seja necessário substituir: demora uma eternidade porque a substituição tem de ser aprovada pelo Ministério das Finanças. (…). Esta burocratização leva também a que os hospitais estejam, nos primeiros quatro meses do ano, a funcionar com ajustes directos, porque qualquer encargo que ultrapasse mais do que uma ano é sujeito a uma portaria que tem de ser assinada por dois secretários de Estado, o que demora mais de nove meses» (Público, 4 de Julho de 2017).

Tantas “dificuldades” em dotar os hospitais e outros estabelecimentos de saúde dos recursos humanos e materiais indispensáveis ao seu correcto funcionamento e em satisfazer as mais elementares reivindicações dos seus profissionais? E tanta tolerância com os especuladores e banqueiros que delapidam as poupanças dos clientes dos bancos que arruínam, desviando os capitais para off-shores? Afinal mudou o governo mas a política não mudou, como recordava Mário Jorge, dirigente da Federação Nacional do Médicos durante a última greve deste sector profissional. E porque não se respeita a vontade da maioria do povo trabalhador que rejeitou o governo Passos-Portas para mudar de política? Não será porque o governo do PS, apoiado pelo PCP e pelo BE, continua a subordinar-se â União Europeia e ao FMI, protectores de banqueiros e especuladores?

Fala-se em remodelar o governo devido à sua incapacidade de resposta à catástrofe de Pedrogão Grande e ao desaparecimento de armas e de munições de paióis do exército. Remodelar para prosseguir a mesma política, mudando apenas alguns actores, como sempre tem acontecido?

Não será o momento de exigir aos deputados do PS, do PCP e do BE, em maioria na Assembleia da República, que revoguem todas as leis e decisões administrativas que impedem a dotação do Serviço Nacional de Saúde dos recursos humanos e materiais necessários ao seu correcto funcionamento e restaurem, reforçando, todos os direitos dos trabalhadores?

Não será o momento das direcções das centrais sindicais e dos sindicatos mobilizarem unitariamente os trabalhadores para impor aos seus eleitos na Assembleia da Republica o respeito pela sua vontade?

Alexandre Ulisses (5 de Julho de 2017)