AMEAÇA DE GUERRA NA UCRÂNIA

Transcrição do BOLETIM DO COI Nº205, de 11 de Fevereiro de 2022

Entrevista de Jim Lafferty:
“Não à guerra americana contra a Rússia!”

Publicamos de seguida uma conversa com Jim Lafferty, director executivo emérito da National Lawyers Guild (Ordem Nacional dos Juristas) em Los Angeles. Ele foi um dos coordenadores nacionais da maior aliança contra a guerra do Vietname, a National Peace Action Coalition. É igualmente membro do comité consultivo de Labor and Community for an Independent Party (LCIP). A entrevista foi conduzida por Alan Benjamin, membro da redacção do jornal The Organizer.

Porque é que, aqui, nos Estados Unidos, nos havemos de opor à militarização e crescente ameaça de guerra na Ucrânia?

Lafferty: Essa é a pergunta fundamental em que toda a gente devia estar a pensar. Deixa-me dar algum contexto antes de re- sponder directamente à pergunta. Todos os dias nos dizem que actualmente o nosso país não está em guerra; mas é óbvio que isso é uma ficção, perpetuada pelos meios de comunicação capitalistas para esconder o que os EUA andam realmente a fazer pelo mundo fora.

A verdade é que os EUA têm actualmente bases militares em 140 países, e há acções militares de diversa natureza em curso em muitos desses países. Ora, não se dão notícias dessas guerras latentes.

Também me parecem necessário dar alguns elementos históricos. Quando a União Soviética se desmoronou, Gorbachev fez um acordo com os EUA, comprometendo-se estes a não tentarem arregimentar antigos estados da União Soviética e países do Pacto de Varsóvia e metê-los na NATO. Além disso, os Estados Unidos ficaram de não se aproveitarem da situação para armar ainda mais fortemente do que já estavam os territórios e e países que circundavam a União Soviética.

Mas não foi isso que aconteceu. A NATO absorveu pelo menos sete nações que faziam parte do Pacto de Varsóvia, muitas delas com armas nucleares. Tudo em contradição com o que se acordara.

As guerras e intervenções americanas têm tido um efeito devastador nos trabalhadores, não só cá, mas no mundo inteiro. Dinheiro que devia ter sido gasto nas necessidades internas vai parar aos bolsos dos fabricantes de armas. O fabrico de armas de guerra dá muito lucro.

O chamado orçamento da “defesa” – que o que é, é um orçamento de guerra – é pesadíssimo.

E as administrações americanas – democratas como republicanas – continuam a usar todas as desculpas e mais algumas para se manterem permanentemente em pé de guerra e justificar, assim, esses gastos vergonhosos e imorais  –  recursos  e  verbas  que,  uma  vez mais, deviam ir, sim, para dar segurança à vida e ao bem-estar dos trabalhadores e populações oprimidas nos EUA e no mundo inteiro.

O que se pode fazer para parar esta guerra iminente contra a Rússia?

Lafferty: É preciso levantar movimentos de massas contra a guerra. Mas temos de ter bem presente que a situação que temos hoje é diferente da que existia durante a guerra do Vietname, quando milhares de soldados das nossas tropas voltavam a casa enfiados em sacos mortuários.

O exército americano encontrou maneira de fazer estas guerras com exércitos ditos de voluntários: exércitos dos pobres, exércitos de gente sem direitos. Já não temos o serviço militar obrigatório – felizmente. Por isso, há muitas outras questões que estão na primeira linha das preocupações do povo americano – dos baixos salários à pandemia da covid, à inflação crescente, à falta de habitação e a tantas outras coisas.

Além  disso,  neste  preciso  momento,  se bem que se esteja a enviar para a Ucrânia cada vez mais armas americanas, o governo americano não fala de mandar para a guerra soldados americanos. Isso torna muito difícil ao povo americano entender o que se está a passar. Nos meios de comunicação oficiais, só se ouve dizer que a Rússia é uma nação horrivelmente agressiva, e que é preciso pará-la antes que ela se apodere da cidade de Toledo, no Ohio, ou coisa do género. Isto tudo torna mais difícil reconstituir o género de movimento de massas de frente única que foi tão bem sucedido no passado. Não quer dizer que não seja possível. Não sabemos o que vai acontecer na semana que vem. A situação no terreno pode mudar rapidamente. Também há hoje muito mais infor- mação disponível pela internet do que havia antes.

RÚSSIA: Declaração de Andrej Kalinkin, membro do grupo de partidários do CORQI na Rússia

O mundo está à beira de uma nova guerra imperialista. Um dos pontos em que se entrechocam os interesses burgueses rivais é o conflito entre a Ucrânia e e as repúblicas separatistas de Donetsk e Lugansk.

É neste contexto que se tem intensi- ficado o confronto entre a Rússia e a NATO. Os dois lados estão concentrando vastas forças militares na zona de conflito e desferindo ataques económicos, diplomáticos e de propaganda um contra o outro.

Como comunistas russos, o nosso primeiro dever é opormo-nos às tendências imperialistas do nosso próprio governo. Não apoiamos a ditadura do grande capital no nosso país. O regime oligárquico de Vladimir Putine faz o que sempre fizeram todos os regimes reaccionários: invocar uma ameaça externa para  atacar sistematicamente os direitos políticos e sociais dos trabalhadores.

Isto não significa, todavia, nenhuma benevolência para com os imperialistas da NATO. Em primeiro lugar, porque, há 30 anos, o capitalismo foi restaurado na Rússia à custa da destruição de segmentos inteiros da economia. Hoje, o nosso país é um país semiperiférico, uma “reserva de matérias-primas” do Ocidente, económica e tecnologicamente mais fraco do que a NATO. Pesa, portanto, sobre os governos dos Estados Unidos e da Europa uma pesada responsabilidade nesta escalada.

Em segundo lugar, do outro lado da sempre hipotética “linha da frente”, os interesses dos trabalhadores são atacados exactamente da mesma maneira do que do lado de cá. Em vez de desferidos em nome do “renascimento  russo”  e  da “paz russa”, são lançados em nome dos “valores democráticos” (a democracia para os ricos) e da “defesa da Ucrânia” (portanto, da defesa dos oligarcas ucranianos, dos nacionalistas burgueses ucranianos e do investimento ocidental). A única saída para o confronto entre Donetsk e Kiev, entre Moscovo e Bruxelas, entre Pequim e Washington, etc., que seja do interesse dos trabalhadores e das amplas massas populares da Rússia e de todo o mundo não consiste em alinhar com nenhum destes estandartes imaginários (brandidos por bandos igualmente repugnantes), mas sim com o nosso próprio lado: contra a guerra, por um novo Zimmerwald; contra o capital mundial, por uma Internacional Operária; contra a “economia de mercado”, pela República Universal dos Conselhos!

UCRÂNIA: Volodymir*, militante operário ucraniano

“Caros camaradas,

“O regime instaurado em 2014 é um regime policial e militar. As oposições de esquerda estão todas proibidas, assim como a “ideologia”, os “símbolos” e a imprensa comunistas. O movimento sindical tem vindo a ser enfraquecido por dirigentes que colaboram com o regime. As  greves são  esporádicas, e são principalmente de mineiros. Qualquer forma de protesto contra o regime é automaticamente rotulada de manipulação do “agressor russo”. Reina o terror em larga escala: as estimativas mais conservadoras dão 5 a 10 mil pessoas presas por “terrorismo” ou “separatismo”. A economia está em declínio, não só por causa do coronavírus, mas principalmente por causa da política de guerra e desindustrialização do regime. “Na  frente  militar  (da  guerra  que tem lavrado desde 2014 no Sudeste da Ucrânia entre o exército ucraniano armado pelos EUA e as milícias separatistas armadas pela Rússia – nota do editor), a mobilização de tropas tem-se intensificado. Em 2019-20, as forças armadas ucranianas tinham 10 grupos de regimentos do exército nas regiões do Sudeste. Em 2021, passou para 13 regimentos (um terço das forças de terra). São 125 mil homens – 150 mil, se se lhes acrescentarem outros ramos militares. Acrescem, à data de finais de Novembro de 2021, mais de 12 mil militares estrangeiros no território da Ucrânia (um terço, tropas americanas). Desde o início de 2021, a Rússia tem respondido a este reforço com mobilização  de  grande  número  de  tropas para a fronteira da Ucrânia. Estimativas ocidentais indicam a presença de 90 a 120 mil soldados russos na raia da Ucrânia. As provocações das tropas ucranianas são legião: além de bombardeamentos e tiros de atiradores, têm usado drones para bombardear zonas povoadas e raptar negociadores e mem- bros das milícias, com fito em futuras trocas de prisioneiros. Queiram aceitar as nossas saudações. Se as notícias não são boas, fiquem certos da nossa fé inabalável no desenvolvimento do movimento antiguerra”.

*nome alterado.