Os BRICS expandem-se: com que objectivo?

Os BRICS, assim chamados quando um economista inventou o acrónimo para salientar semelhanças entre as economias do Brasil, da Rússia, da Índia, da China e da África do Sul, constituíram-se como grupo formal em 2011.

Em cimeira realizada de 22 a 24 de Agosto na África do Sul, o grupo alargou-se. A partir de 10 de Janeiro do próximo ano, Arábia Saudita, Argentina, Egipto, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irão também serão membros. Há outros “candidatos”.

Uma parte da cena política convencionalmente considerada “de esquerda” pretende ver neste alargamento “uma pedra atirada à ordem mundial”, “uma boa notícia para o mundo, com impacto significativo na luta de classes” ou coisa que o valha.

Serão ou poderão os BRICS ser uma “força alternativa” à que reúne as sete grandes potências imperialistas (o G7) da América do Norte, Europa e Japão sob a égide do imperialismo americano?

O que une, afinal, os velhos (e os futuros novos) membros dos BRICS? “Unem-nos” as relações específicas, e muito diferentes, que cada um dos regimes mantém com o imperialismo americano – não as que mantêm entre eles.

Tais relações são relações de subordinação histórica. Nalguns casos, com aspectos ou momentos de conflito. A Arábia Saudita, por exemplo, regime semifeudal que sobrevive à sombra do guarda-chuva americano, acaba de chegar a um acordo com a Rússia sobre a produção de petróleo, com o objectivo de aumentar as receitas de ambos no respectivo mercado mundial. E, recentemente, fez ligeiras aproximações ao regime do Irão.

A coesão do bloco é, pois, nula. A Índia de Modi participa, sob a égide dos Estados Unidos, em todas as manobras militares contra a China, com a qual tem um conflito fronteiriço de longa data. Ambas são esteios dos BRICS…

No entanto, é indesmentível que a existência e alargamento dos BRICS põem em evidência que, por esmagador que seja o domínio do imperialismo norte‐americano, as contradições e conflitos não só não desaparecem, como se agravam.

O capitalismo, por maioria de razão na sua fase final, imperialista, é fautor da sua própria, constante crise. Hoje, o imperialismo americano só pode reagir à crise, aumentando a agressividade com que trata não só os regimes neocoloniais, mas também todos os imperialismos subalternos – e as potências regionais que ele próprio até certo ponto alimentou para consolidar o seu poder no mundo. 

Mas nem sempre os interesses das potências regionais estão perfeitamente alinhados com Washington. Quando o gigante americano começa a dar mostras de dificuldade em lidar com as crises que provoca, é natural que essas potências, frequentemente armadas até aos dentes (a Arábia Saudita para conter o Irão, por exemplo) tentem tirar proveito próprio da desordem mundial criada pelo imperialismo. É com isso que Biden e a sua administração têm de lidar.

Contudo, os BRICS não têm nada que ver com a luta dos trabalhadores e dos povos oprimidos. Nenhum dos regimes que os compõem é amigo dos trabalhadores. Seja o ultra-reaccionário Modi, a mafia capitalista de Putin ou os chefes da burocracia chinesa, todos eles oprimem e reprimem as suas classes trabalhadoras. A presença na presidência da cimeira dos BRICS de Cyril Ramaphosa (presidente da África do Sul e carrasco dos mineiros de Marikana*) foi simbólica.

Que o presidente Lula do Brasil apareça, em nome de vagas teorias sobre o “Sul global”, a alimentar ilusões entre os trabalhadores do seu país e do mundo a respeito dos BRICS é lamentável – e tema para futuro desenvolvimento.

* Em Agosto de 2012, a polícia governamental do ANC atacou a greve na mina de Marikana, massacrando 34 mineiros negros. Ramaphosa, accionista da multinacional Lonmin, exigiu a repressão.