“SEGUNDA NAKBA”?

A braços com acusações de corrupção e ameaçado por meses de contestação nas ruas, o primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, formou, para tentar sobreviver, um governo de coligação da extrema-direita supremacista judaica. Dele fazem parte expoentes do movimento dos colonos como Bezalel Smotrich, Ministro das Finanças (responsável pela ocupação israelita da Cisjordânia), e Itamar Ben-Gvir, Ministro da Segurança Nacional, cujas opiniões racistas o impediram de prestar serviço militar nas forças armadas israelitas: de racistas fanáticos e de extrema-direita, relativamente marginais na política israelita, a detentores de ministérios-chave. O programa desta gente é, no dizer de um membro do Knesset, provocar “uma segunda Nakba” (referência à expulsão de palestinianos que Israel levou a cabo em 1948): expulsar os palestinianos de todo o território da Palestina histórica.

Israel tem escalado a política de expansão dos colonatos desde que foi criada a Autoridade Palestiniana. O actual governo, porém, elevou o confronto a um nível sem precedentes (razão pela qual o grosso das forças armadas israelitas estava colocado na Cisjordânia quando dos acontecimentos de 7 de Outubro). Entretanto, os ataques perpetrados por colonos contra palestinianos na Cisjordânia mais do que duplicaram, passando de uma média diária de três para sete, num total de mais de 200 desde 7 de Outubro. 378 palestinianos foram mortos este ano na Cisjordânia (até 9 de Novembro; quase metade deles desde 7 de Outubro), principalmente por militares israelitas, mas alguns por colonos, cujas acções gozam de total impunidade. Este é o contexto da brutal resposta do governo de Netanyahu aos acontecimentos de 7 de Outubro. A ideia não é “erradicar o Hamas”, mas sim aproveitar a ocasião para dar continuidade, na faixa de Gaza, ao programa geral de ocupação de todo o território da Palestina histórica, expulsando ou eliminando todos os palestinianos.

Em discurso directo

A 28 de Outubro, Netanyahu disse que os israelitas estavam unidos na luta contra o Hamas, descrito como um inimigo de crueldade incomparável, e “determinados a eliminar completamente este mal do mundo”, disse Netanyahu em hebraico. E acrescentou: “Lembrai-vos do que Amaleque vos fez, diz a nossa Bíblia Sagrada. E nós lembramo-nos”.

No primeiro livro de Samuel, o deus dos judeus ordena ao rei Saul que mate todas as pessoas em Amaleque, nação rival da antiga Israel. “Assim diz o Senhor Todo Poderoso”, disse o profeta Samuel a Saul. “Castigarei os amalequitas pelo que fizeram a Israel quando os atacaram depois da saída do Egito. Agora ide, atacai os amalequitas e destruí totalmente tudo o que lhes pertence. Não os poupeis; matai homens e mulheres, crianças e bebés, gado e ovelhas, camelos e burros.

Esta sinistra referência é uma das muitas em que dirigentes israelitas revelam o programa expresso na cruel e devastadora resposta ao ataque do Hamas de 7 de Outubro.

O ministro israelita do Património, Amichai Eliyahu, disse que “uma das opções de Israel na guerra em Gaza é lançar uma bomba nuclear na Faixa”, relatou o diário Times of Israel. Netanyahu “suspendeu-o”.

Em entrevista à rádio, Eliyahu objectou também a que se autorizasse qualquer ajuda humanitária a Gaza: “Então também dávamos ajuda humanitária aos nazis?”, disse o ministro, acrescentando que “em Gaza, não há civis que não estejam envolvidos”; a população palestiniana “pode ir para a Irlanda ou para o deserto, os monstros de Gaza que arranjem uma solução”; e “quem agitar uma bandeira palestiniana ou do Hamas não deve continuar a viver à face da terra”. Um porta-voz militar disse dos ataques aéreos iniciais de Israel que “a prioridade é fazer estragos, não fazer pontaria”.