Em 19 de Outubro de 2023, os eurodeputados do Bloco de Esquerda votaram, no mal denominado “Parlamento Europeu”, a favor de uma resolução de apoio e incentivo à guerra do Estado de Israel contra o povo palestiniano. A resolução foi aprovada por grande maioria: votaram-na toda a extrema-direita e direita, mas também grande parte da “esquerda”.
É inimaginável que este voto não provocasse a indignação dos militantes do Bloco, pelo menos dos que dele souberam (a direcção teve o cuidado de lhe dar nula publicidade).
Uma semana mais tarde, o BE pediu ao parlamento para mudar o registo do sentido do seu voto. O efeito material do voto ficou, é claro, inalterado.
Porém, a direcção do BE não se ficou por aí. Desde então, não encontra melhor do que exigir a aplicação das resoluções da ONU. A primeira, a nº 181 de 1947, é precisamente a que impõe a partição da Palestina.
O BE adere, deste modo, à farsa montada por Biden e seus acólitos, incluindo a ONU, de desenterrar a chamada “solução de dois Estados” do esquecimento a que há muito a organização sistemática da expulsão do povo palestiniano pelo Estado de Israel a votara. É um esfarrapadíssimo expediente ante o movimento de massas mundial contra o genocídio sionista.
Convém recordar o contexto. Pelos acordos de Oslo de 1993/95, impôs-se à Organização de Libertação da Palestina (OLP), representação política do povo palestiniano, a aceitação formal da “solução de dois Estados” e a renúncia à reivindicação fundamental da Carta da OLP de independência nacional da Palestina no seu território histórico, como república una, democrática e laica “do rio até ao mar”. O propósito era, e o efeito foi, destruir a própria OLP.
O genocídio conduzido pelo Estado sionista contra o povo palestiniano mergulha as suas raízes no acordo entre o imperialismo americano e Stalin no final da Segunda Guerra Mundial, que criou o Estado de Israel – acordo materializado na referida resolução nº 181, de partição do território histórico da Palestina entre um “Estado judeu” e um “Estado árabe”. Este último nunca viu, bem entendido, a luz do dia. O Estado de apartheid de Israel ocupa directa ou indirectamente toda a Palestina (assinale-se que, se houvesse, da parte de Israel e dos EUA, a mínima intenção de levar avante a “solução de dois Estados” – e não havia nem há – , esta significaria sempre, entre outras coisas, a manutenção do regime de apartheid na maior parte da Palestina histórica).
A realidade, hoje, é esta: o Estado sionista, com o enorme poderio militar que lhe é conferido, sustentado e garantido pelos Estados Unidos, trava uma guerra de genocídio contra o povo palestiniano na faixa de Gaza, na sequência e a pretexto da incursão militar de guerrilheiros islamistas do Hamas nas imediações de Gaza, em 7 de Outubro. O genocídio em Gaza é coadjuvado por assassinatos indiscriminados perpetrados pelo exército e colonos sionistas na Cisjordânia ocupada. Israel leva às últimas consequências o processo de limpeza étnica iniciado com os massacres e expulsões de 1948 (a Nakba).
Ainda assim, poucos terá surpreendido que os imperialismos europeus subalternos se precipitassem, como já acontecera no caso da guerra na Ucrânia, para manifestar a sua obediência às ordens de Washington e aos desejos de Tel Aviv. A presidente da Comissão Europeia distinguiu-se particularmente, com quase indisfarçados apelos ao extermínio de Gaza. O “Parlamento” Europeu apressou-se a aprovar a resolução acima referida. A frase de código usada para cobrir a operação de extermínio é “o direito de Israel a defender-se” – “direito” que, como assinalado por especialistas (mas silenciado pela propaganda da comunicação social), nem sequer existe no “direito internacional” da ordem imperialista actual, que apenas reconhece um “direito de autodefesa” em caso de agressão de um Estado a outro.
A direcção do Bloco nunca deu explicação séria aos trabalhadores e à juventude sobre a sua inacreditável capitulação ao imperialismo e ao sionismo.
Antes, votara já sucessivos orçamentos de austeridade impostos pela União Europeia, sob a geringonça. Votou depois, também no Parlamento Europeu, várias resoluções a favor da guerra na Ucrânia, do reforço da NATO e do rearmamento e militarização dos Estados imperialistas.
A sua vergonhosa posição sobre a Palestina sela a sua passagem definitiva para o campo do imperialismo.