A REVOLTA DOS AGRICULTORES EM FRANÇA

Pela aliança operária e camponesa!

Uma tremenda explosão de cólera, que beira a revolta, trouxe milhares de agricultores para as estradas, onde montaram muitas barreiras, para dar voz às suas reivindicações. Raiva tingida de desespero, vinda de baixo, dos estratos mais pobres, dos mais esmagados, que já não conseguem viver do seu trabalho.

O governo percebeu. Alardeia – para já – vontade de diálogo, evita o confronto. Na verdade, multiplica-se em reuniões, mas só com com os dirigentes da Federação Nacional dos Grémios de Empresários Agrícolas (FNSEA) e dos Jovens Agricultores (JA), com o fito de selar uma aliança entre o governo e os “grandes”, os muito grandes proprietários, de modo a barrar o movimento dos “pequenos”, que já não aguentam mais.

É aqui que entra a diferença entre a classe operária e o mundo camponês. A classe operária abrange todos os assalariados, uns 27 milhões, obrigados a vender a sua força de trabalho para ganhar a vida. Os quadros superiores não vivem, é claro, nas mesmas condições que os trabalhadores precários. Mas o que todos têm em comum é terem de vender a sua força de trabalho em troca de um salário: no sector privado, vendê-la a um patrão que faz lucro com a exploração da força de trabalho; no sector público, vendê-la para que possam funcionar, ao menor custo possível, os serviços do Estado e das autarquias essenciais ao sistema de exploração capitalista. Daí serem comuns as reivindicações de toda a classe trabalhadora face, por exemplo, à reforma do regime de pensões.

O que é comum a toda a classe camponesa? Formalmente, todos os camponeses “possuem” e utilizam os seus próprios meios de produção. Mas tal unidade é uma ficção. No topo, os grandes agricultores são verdadeiros capitalistas. A ilustrá-lo, o presidente da FNSEA, alegado porta-voz de todos os camponeses, é proprietário dos óleos Lesieur e de dezenas de indústrias pelo mundo. Como todos os capitalistas, ele explora os seus empregados. As normas com que diz querer acabar são normas que lhe restringem o direito de explorar a força de trabalho de outrem.

Em contrapartida, os pequenos agricultores, se bem que formalmente proprietários dos seus meios de produção, na maior parte das vezes têm tudo hipotecado; proprietário é o banco. Quando se reformam, é com uma pensão miserável.

A questão é: como é possível que, na sétima potência industrial do mundo, que é também uma grande nação agrícola, os produtores de frutas, legumes, carne e vinho não consigam viver do seu trabalho? E como é possível que, “do outro lado”, os assalariados e suas famílias já não consigam comprar o estritamente necessário para se alimentarem?

Quem compra os produtos agrícolas aos agricultores a preços irrisórios? Quem os revende a preços exorbitantes?

Na realidade, protagonistas da actual crise são as multinacionais agro-alimentares, a grande distribuição e os grossistas intermediários que, como dizem os agricultores “se enchem todos à nossa custa”, porque o governo “faz as leis para os grandes grupos”.

Sabiam que entre as quarenta empresas do índice CAC40, que acabam de distribuir mais de 100 mil milhões em dividendos aos accionistas, estão a Carrefour, a Danone, o Crédit agricole? Todos eles distribuem milhares de milhões aos accionistas, milhares de milhões roubados aos pequenos camponeses, cuja produção é comprada a preço vil e depois rende margens enormes, à custa dos consumidores.

Esta política para os “grandes” é organizada pelo governo Macron a soldo dos capitalistas e protegida e encorajada pelas directivas da União Europeia.

Que saída para a situação? A aliança operária e camponesa, a aliança entre os trabalhadores, os assalariados e os pequenos agricultores. Aliança que se deveria traduzir numa política de defesa conjunta dos produtores e dos consumidores: garantindo preços à produção a um nível que permita aos agricultores viverem do seu trabalho e a todos os trabalhadores um aumento geral dos salários, que aumente o seu poder de compra; introduzindo a escala móvel de salários, indexados aos preços; e confiscando, para o efeito, os lucros gigantescos dos Crédit agricole, Danone, Carrefour e outras multinacionais, de modo que todos possam viver do seu trabalho e alimentar-se adequadamente.

Assim seria a política de um governo de aliança operária e camponesa, de defesa dos trabalhadores das cidades e dos campos.

[Editorial de La Tribune des travailleurs, nº 425, 31 de Janeiro de 2024]