O anúncio feito pelos governos espanhol, irlandês e norueguês de que reconheceriam o “Estado da Palestina” apareceu, a muitos palestinianos, como pequeno raio de esperança.
Sujeito a um genocídio de que são cúmplices todas as grandes potências e instituições internacionais, o povo palestiniano sente-se, legitimamente, “abandonado”. Ainda que saiba distinguir entre governos, por um lado, e povos e trabalhadores do mundo, que lhe têm manifestado a sua solidariedade, por outro.
Será que o reconhecimento simbólico, por três governos, de um “Estado da Palestina” que só existe no papel resolve o problema de uma solução democrática para todos os habitantes da Palestina?
É evidente que não. Em primeiro lugar, porque o genocídio continua. E continuará enquanto os grandes “democratas” Biden, Scholz, Sunak, Macron, Montenegro e companhia continuarem a fornecer armas a Netanyahu e a manter as suas relações diplomáticas, económicas e militares com Israel.
Em segundo lugar, porque a verdadeira questão é: que Estado para os palestinianos? Uma “Autoridade” fantoche, que governa farrapos de territórios sujeito ao controlo do exército israelita, como é o caso desde os Acordos de Oslo (1993)?
Ou um Estado uno, laico e democrático para todos os cidadãos em todo o território da Palestina histórica? Esta perspectiva, como lembra uma declaração recente (ver abaixo), foi “abandonada pela Organização de Libertação da Palestina (OLP) quando esta adoptou o seu ‘programa de dez pontos’ em 1974 e a palavra de ordem de ‘Estado palestiniano independente’ em 22% da terra da Palestina (aCisjordânia e a Faixa de Gaza – nota do editor). Estas concessões culminaram nos Acordos de Oslo de 1993, que reconheceram a ‘legitimidade’ do Estado sionista, excluindo os palestinianos dos territórios de 1948 e os palestinianos da diáspora.” Não obstante, apesar das traições e das tragédias, activistas árabes e judeus da Palestina não desistem de abrir caminho para uma solução democrática. Aqui, como sempre, damos-lhes voz.
20.000 palestinianos descrevem, com a ODSI (One Democratic State Initiative), “a Palestina de amanhã” a que aspiram (extractos):
“Um Estado palestiniano, com Jerusalém como capital, que dê corpo ao direito do povo palestiniano à autodeterminação…”
A Palestina de amanhã, afirma o apelo, será “um Estado palestiniano, com Jerusalém como capital, que dê corpo ao direito do povo palestiniano à autodeterminação e reflicta a sua soberania sobre a totalidade do seu território, permitindo o direito ao regresso dos refugiados palestinianos e torne a cidadania palestiniana extensiva a todos os judeus nascidos na Palestina que rompam com o sionismo e desejem ficar, como palestinianos. (…)
Um Estado democrático, um Estado para todos os seus cidadãos, sem discriminação de religião, etnia, cultura, língua, sexo ou género, assim preservando a especificidade do património palestiniano na sua diversidade cultural, religiosa e étnica (…).
Um Estado laico, que separe religião e política, que não reivindique nenhuma legitimidade religiosa, proteja a liberdade de crença, o direito de cada um a professar e praticar a sua religião, bem como todos os direitos fundamentais, e que recuse conceder ou negar privilégios por causa da filiação religiosa, ideológica ou cultural de uma pessoa, em ruptura total com o sionismo e a sua natureza sectária.
Um Estado socialmente justo, cujas instituições assentem no princípio de igualdade económica e social (…). Um Estado que liberte as classes populares da pobreza, do desemprego e da marginalização, que garanta uma educação gratuita e de qualidade, segurança social e os direitos dos trabalhadores.
Um Estado de direito (…) que garanta os direitos de todos, sem excepção. Garanta, portanto, antes de mais, os direitos imprescritíveis, inegociáveis e inalienáveis do povo palestiniano, em particular o direito ao regresso dos refugiados e a reparações por décadas de exílio (…). A justiça feita aos palestinianos em matéria de propriedade, residência ou outra não se traduzirá por novas injustiças à custa da população judaica que tiver renunciado aos seus privilégios coloniais. (…)”